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terça-feira, 21 de setembro de 2010

Tyler Durden's Excerpts

Trabalhar, consumir, dormir, insônia, aos poucos percebendo que sua vida não passa de uma cópia, de uma cópia, de uma cópia... O médico sugere que visite grupos de apoio para portadores de câncer de testículo. Procura grupos de portadores de outros tipos de câncer, se tornando um viciado, até que um certo dia se depara com Marla, e a mentira de Marla reflete sua mentira. O apartamento explode inesperadamente, com todas as mobílias arrumadas, os discos em seus lugares, a coleção de louça importada, ... Aparece Tyler Durden, com propostas de terrorismo poético, começa o Clube da Luta, a se encarar a vida como algo a ser experimentado com brigas, "quanto você conhece de si mesmo se nunca entrou numa briga?". As vivências vão se entrelaçando, conduzindo e potencializando um processo esquizofrênico. Trabalhamos para produzir o que não consumimos, consumimos o que não é necessário, guardando em nossas vidas um estoque de coisas que não utilizamos, e acabamos nunca ficando satisfeitos.. Tudo o que o sistema precisa para funcionar são pessoas para produzir de um lado e pessoas para consumir de outro. E o que é pior, somos nós os que produzem e consomem, servindo de alimentação dessa condição. "Você não é seu emprego ou o dinheiro que possui", "as coisas que você possui acabam te possuindo", "essa é a sua vida e está acabando a cada minuto". “A propaganda nos faz correr atrás de coisas e a trabalhar em empregos que odiamos para comprar porcarias de que não precisamos". Por que consumimos besteiras que as propagandas nos vendem? Por que nos submetemos a trabalhar em serviços que não gostamos? Vamos morrer um dia e nossa vida terá sido a mesma se não mudar a maneira de encarar as relações.. depois de morrer não teremos mais nada de nada. "Você nem quer saber onde moro, o que sinto, como alimento meus filhos ou como vou pagar o médico se ficar doente”. “Fomos criados pela televisão para acreditar que um dia seríamos ricos, estrelas de cinema e do rock, mas não seremos, e estamos aos poucos aprendendo isso".



segunda-feira, 20 de setembro de 2010

O inferno brasileiro

Honra ou vergonha? Orgulho ou pena?

Fala-se de um momento histórico em que conceitos diametralmente opostos como esses se confundem de maneira homogênea na mente de uma sociedade perdida, confusa, mergulhada em profundezas sem sequer perceber, nadando em texturas que sequer podem discernir. Os pólos que por séculos nortearam o bom-senso geral se encontram num choque mais cataclísmico que o de placas tectônicas; princípios basilares são violentamente consumidos pelo buraco negro da relativização. E nesse terremoto muito mais do que vidas estão sendo dizimadas, mas a própria essência do ser, a primazia da construção interior humana vem sendo varrida impiedosamente enquanto os mais bravos observam o que ainda resta de valor escorregar rapidamente por seus dedos; e ainda faltam condições para que as mãos se fechem e se juntem a rostos iluminados parcialmente por um, quem sabe, último lampejo de consciência criadora.



'A toda hora aparecem pastores, padres, sobretudo jornalistas e políticos – sim, jornalistas e políticos, essas personificações supremas da moralidade – clamando contra “a degradação dos costumes”. O próprio termo completamente deslocado que empregam para nomear o mal prova que são parte dele. “Degradação dos costumes” é uma expressão quantitativa, escalar: supõe a vigência permanente de uma escala contra a qual se mede o decréscimo da obediência rotineira aos valores que ela quantifica.

O que se passa no Brasil não é uma “degradação dos costumes”: é a destruição premeditada de todas as escalas, a inversão sistemática de todos os valores.

Os costumes degradam-se quando a população já não consegue imitar nem de longe os modelos melhores de conduta que a História consagrou e que, ante o olhar de cada geração, se reencarnam de novo e de novo nas figuras das personalidades admiráveis, dos sábios, dos heróis e dos santos.

Quando, ao contrário, todas as personalidades admiráveis desapareceram ou foram postas para escanteio, e em seu lugar se colocam simulacros grotescos ou inversões caricaturais, o problema já não é a desobediência, mesmo generalizada, a valores que todos continuam reconhecendo da boca para fora; é, ao contrário, a obediência a modelos de malícia, perversidade e covardia que se impuseram, pela força da propaganda e da mentira, como as únicas encarnações possíveis do meritório e do admirável.

Quanto mais alto esses personagens sobem na hierarquia social, mais esfumada e distante vai ficando, até desaparecer por completo, a escala de valores que permitiria julgá-los e condená-los; e mais e mais eles próprios se consagram como unidades de medida de uma nova escala, monstruosamente invertida, que em breve passa a ser a única. Daí por diante, quem quer que não a siga e cultue dificilmente poderá evitar a sensação de marginalidade e isolamento que é, nesse quadro, o sucedâneo perfeito do sentimento de culpa. Calou-se, na alma de cada cidadão, a voz da consciência que, na escura solidão da sua alma, lhe trazia a lembrança amarga de seus delitos e de seus vícios. Em lugar dela, desenvolve-se uma hipersensibilidade epidérmica à opinião dos outros, ao julgamento do grupo, ao senso das conveniências aparentes.

Preso na trama virtual dos olhares de suspeita, cada um vive agora em estado de sobressalto permanente, obsediado, ao mesmo tempo, pela compulsão de exibir equilíbrio, tranqüilidade e polidez para não se tornar o próximo alvo de desprezo. A essa altura, cada um se dispõe a renegar ideais, amizades, lealdades, admirações, promessas, ao primeiro sinal de que podem condená-lo a um ostracismo psíquico que se anuncia tanto mais insuportável quanto mais tácito, implícito e não reconhecido como tal.

Há uma diferença enorme entre um “estado de medo” e uma “atmosfera de medo”. O primeiro é patente, é público, todos falam dele e, não raro, encontram um meio de enfrentá-lo. A segunda é difusa, nebulosa, esquiva, e alimenta-se da sua própria negação, na medida em que acusar sua presença é, já, candidatar-se à rejeição, à perda dos laços sociais, ao isolamento enlouquecedor.

Nessa atmosfera, a única maneira de evitar o castigo ante cuja iminência se treme de pavor é negar que ele exista, e, com um sorriso postiço de serenidade olímpica, ajudar a comunidade a aplicá-lo a imprudentes terceiros que tenham ousado notar, em voz alta, a presença do mal.

Não digo que todos os brasileiros tenham se deixado submergir nessa atmosfera. Mas pelo menos as “classes falantes”, se é possível diagnosticá-las pelo que publicam na mídia, já têm sua consciência moral tão deformada que até mesmo suas ocasionais e debilíssimas efusões de revolta contra o mal vêm contaminadas do mesmo mal. Por exemplo, o fato de que clamem contra desvios de dinheiro público com muito mais veemência do que contra o massacre anual de 50 mil brasileiros (quando chegam a dar-lhe alguma atenção) prova, acima de qualquer possibilidade de dúvida, que por trás do seu ódio a políticos corruptos não há uma só gota de sentimento moral genuíno, apenas a macaqueação de estereótipos moralistas que ficam bem na fita. E que ainda continuem discutindo “se” o partido governante tem parceria com as Farc, depois de tantas provas documentais jamais contestadas, mostra que estão infinitamente menos interessadas em averiguar os fatos do que em apagar as pistas da sua longa e obstinada recusa de averiguá-los. Recusa que as tornou tão culpadas quanto aqueles a quem, agora, relutam em acusar porque sentem que acusá-los seria acusar-se a si próprias. Quando, por indolência seguida de covardia, os inocentes se tornam cúmplices ex post facto, já não sobra ninguém para julgar o crime: todos, agora, estão unidos na busca comum de um subterfúgio anestésico que o suprima da memória geral.

Não, não se trata de “degradação dos costumes”, como nos EUA, na França, na Espanha ou em tantos outros países: Trata-se, isto sim, da perda completa do senso moral, o que faz deste país uma bela imagem do inferno. No inferno não há degradação, porque não há a presença do bem para graduá-la.'

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Olavo de Carvalho


sábado, 18 de setembro de 2010

O pacato tem vida longa

'Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração; e encontrareis descanso para as vossas almas.' Mt. 11 - 29

'Bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra.' Mt.5 - 5




Para viver, deixe viver. As pessoas pacíficas não vivem apenas, reinam. Ouça e veja, mas mantenha-se calado. Um dia sem tensões significa uma noite repousante. Viver muito e com gosto é viver duplamente: é fruto da paz. Tem tudo aquele que não se preocupa com aquilo que não importa. Não há bobagem maior do que levar tudo muito à sério. Manter-se aberto àquilo que não interessa é tão tolo quanto não se envolver com aquilo que interessa.

Não se envolver em complicações.Eis uma das primordiais preocupações da prudência. É longo o caminho a percorrer de um extremo a outro, e os prudentes permanecem na área central da sensatez. É decisão amadurecida romper tal estado, pois é mais fácil tirar o corpo do perigo do que sair-se bem dele. As situações perigosas colocam nosso bom senso na berlinda, e é mais seguro evitá-las por completo. Uma complicação traz outra maior, conduzindo-nos à beira do desastre. Alguns são precipitados, por temperamento ou por nacionalidade, e é com rapidez que se envolvem em situações perigosas. Mas aquele que caminha à luz da razão avalia a situação e percebe que há mais valor em evitar o perigo do que em vencê-lo. Vendo que já existe um tolo imprudente, evita ser-lhe segundo.



Baltasar Gracián

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Céu e Inferno


“Um dia um aprendiz perguntou a seu mestre qual a diferença entre o céu e o inferno, e o mestre respondeu:

- Amado aprendiz, o inferno é como um grupo de pessoas sentadas ao redor de um monte de arroz delicioso, cada uma destas pessoas com talheres muito longo e por este motivo, estas pessoas não conseguem colocar o arroz na própria boca, por seu egoísmo (falta de compreensão!) morrem de fome.

- Já o céu, é um outro grupo de pessoas também sentadas ao redor de um monte de arroz, também com talheres muito longo, só que cada uma destas pessoas alimenta a outra, e por este motivo todos ficam satisfeitos e felizes.”


Eu sempre gostei de definições simples para questões complicadas; sobretudo em temas polêmicos e controversos como interpretações religiosas.

É verdade que não saberemos o real significado de dois lugares tão paradoxais e etéreos em vida, mas isso me fez questionar a possibilidade da existência de um céu e um inferno mesmo no mundo material.

Ora observando, ora participando, ora protagonizando episódios que se repetem como ciclos na vida de tantas pessoas, vejo como a mesma situação ou experiência pode ser encarada com conotações completamente diferentes por quem as vive direta ou indiretamente, abrindo espaço para a compreensão da noção a piori de céu, inferno e quem sabe até um purgatório físico/mental.

Sempre que somos colocados em situações de extrema carga emocional/sentimental somos levados a nossos extremos de conduta, de comportamento, permitindo que nossa consciência busque no âmago do nosso ser, forças, respostas, conformismo, ou mesmo um estado débil de contentamento (estado esse mais ligado ao purgatório físico). A diferença me parece estar ligada à forma como cada indivíduo encara essas experiências extremas, sendo fácil detectar as pessoas que optam por levar situações de forma mais realista, outras de forma mais emotiva, e outras de forma indiferente.

Cumpre frisar que dentro dessa análise não estou sequer analisando a possibilidade de absorção de conhecimento, bagagem de vida ou mesmo aplicação de situações traumáticas anteriores na resiliência dos fatos que servem de embasamento empírico para o que desenvolvo nesse argumento; trato aqui, apenas de uma escolha quase que instintiva de maneiras diversas de encarar as desventuras ou exacerbados sucessos a que estamos sujeitos ao longo de nossa jornada nesse imenso jardim do Éden, hoje com tantas e tantas árvores de frutos proibidos cada vez mais frondosas e apetitosas aos nossos olhos, que já se identificam com tais frutos não somente com a curiosidade da primeira mulher que o provou, mas com o temível conhecimento do bem e do mal, o tornando não somente a refeição principal do que nos afasta do paraíso, mas como uma doce e fatal sobremesa que chega ao estômago envolta em chamas furiosas.

É sempre mais convidativo à natureza acomodada e territorialista humana optar por levar tudo para o lado pessoal, principalmente quando estamos no pólo socialmente vitimizado da contenda, nos tornando convenientemente dignos de compaixão geral e opinião pública favorável, principalmente no contexto da sociedade brasileira, marcada por características mais cálidas, amistosas, abertas, para não dizer emocionais, frívolas e orgiásticas. O grande problema é que esse tipo de atitude, apesar de abrasadora para egos e consciências, é o que torna o homem para o lado do inferno em vida, trazendo para si perturbações e inquietudes infindáveis e sucessivas, ao contrário daqueles que aprenderam a adotar uma postura mais fria, madura e realista a despeito de eventualidades que possam atingi-lo pessoalmente (uma vez que é notoriamente fácil reagir com frieza, altivez e aparente maturidade diante de situações que não nos afetam interior, fisica ou financeiramente).

No meio do caminho estão aqueles que com sucesso amortizaram seus egos, vontades e desejos, ainda que não completamente, mas o suficiente para desfrutarem de um nível satisfatório de desapego, superação e indiferença quando colocados diante de medos, perdas e revezes, apenas sobrepondo-se a todo tipo de contrariedade, contudo sem se polarizar e transformar aquilo numa oportunidade, lição ou plataforma de transformação em algo positivo ou desejável. Geralmente essas pessoas são menos atormentadas em vida, porém possuem menos propensão para assimilar grandes alegrias e estados de prazer, uma vez que resignaram-se de tais sentimentos, bem como dos negativos outrora mencionados.

E por fim chegamos ao conhecimento dos querubins e serafins tácteis, aqueles que não só saíram do estado de penúria terrena, mas também impuseram silêncio aos desejos rasteiros humanos, vencendo a si mesmos, mas ainda foram capazes de fazer disso algo divino; que passa da água e do metal, surpassa o vinho e o ouro, atingindo um estado nobre de vida, como um processador de espinhos que fabrica pétalas perfumadas de rosas, que embora possuam espinhos para ensinar o preço de tudo na vida, inundam por onde passam com beleza, perfume e suavidade. São os esclarecidos de corpo, alma e espírito, que pouco valor dão a si mesmo, não se permitem identificar com a pequenez e o vazio terrenos, mas se encontram conscientemente num plano elevado de existência, como um corpo que vaga pelo mundo material, mas cujos olhos e espírito já estão no pós-morte, o paraíso.

Como tudo na vida, a escolha é particular, o caminho estreita-se à medida que subimos nossas pretensões. Mas como aquele que esvaziou-se de si voluntariamente sem carregar culpa alguma sempre estará sob o domínio das três áreas que parecem nos cercar antes mesmo da morte física. Que o sol brilhe fulgorosamente sob a face dos que para cima olham, enchendo suas vidas com o calor, a energia e a força necessárias para que alvas asas se abram por trás dos olhos dos que sonham e lutam.







"O que podemos saber é muito pouco e, se esquecemos o quanto nos é impossível saber, tornamo-nos insensíveis a muitas coisas sumamente importantes" Bertrand Russel